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Documentos digitalizados – validade jurídica

Postado por:  Dr. Geraldo Fortunato Neves

Tradicionalmente, a cultura jurídico-brasileira sempre privilegiou, como regra geral, o documento em sua forma original, só emprestando validade na sua substituição quando consistente em cópia autenticada.

Tal exigência sempre causou, principalmente nas últimas décadas, inquietude no meio empresarial, já que, inobstante a existência de tecnologias que permitem conservar o documento físico ao longo do tempo, preservando todas as características necessárias à sua finalidade, inclusive sem prejuízo da sua qualidade, a utilização destas tecnologias esbarravam em exigências legais, principalmente quanto à necessidade da conservação do documento original. Ou seja, na maioria das vezes, aliás, isto está expresso em alguns atos administrativos emitidos pelas autoridades competentes, a utilização da tecnologia era permitida, mas a mesma não substituía a obrigatoriedade da manutenção do original em papel.

É bem verdade que existiam algumas exceções a esta prática. Alguns órgãos, atentos às vantagens de que o uso de algumas tecnologias trazia às partes, disciplinaram o uso das mesmas, dando a elas, desde que cumpridos os requisitos previstos na legislação própria, cunho legal para o seu uso.

A primeira iniciativa de carácter legal dando curso legal aos documentos digitalizados veio através da Medida Provisória n.º 12.682 de 09 de julho de 2012, que dispondo sobre a elaboração e o arquivamento de documentos em meios eletromagnéticos, permitia, entre outros, a digitalização de documentos públicos e privados, hipótese em que cumpridas a exigências contidas naquela norma, era permitida a destruição dos originais.

No entanto, com base em alguns argumentos, entre os quais, a utilização de alguns conceitos de forma assintomática, a Presidenta da República vetou o referido artigo, eliminando àquela permissão.

A última grande e atual novidade sobre o tema veio a público com a Medida Provisória n.º 881, datada de 30 de abril do presente ano, a qual, instituindo a Declaração de Direitos de Liberdade Econômica, estabeleceu garantias de livre mercado, análise de impacto regulatório, e dá outras providências, dentre elas, definiu em seu artigo 3º ser direito de qualquer pessoa, natural ou jurídica:

X - Arquivar qualquer documento por meio de microfilme ou por meio digital, conforme técnica e requisitos estabelecidos em regulamento, hipótese em que se equiparará a documento físico para todos os efeitos legais e para a comprovação de qualquer ato de direito público.

No entanto, a eficácia desta permissão, consoante disposição expressa contida em seu artigo 17º, está condicionada a vigência de regulamentação pelo executivo federal.

O projeto de conversão desta medida provisória em lei foi aprovado dia 12 último, por comissão mista da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, pendendo agora de apreciação pelo plenário das duas casas do Legislativo.

Notícias dão conta de que mais 100 Emendas foram aprovadas naquela apreciação, alterando o texto original da referida Medida Provisória. No entanto, a análise rápida do referido projeto demonstra, especificamente em relação ao assunto aqui discutido, ausência de alterações que dificultam a utilização dos documentos digitalizados em substituição aos documentos originais. Aguardamos a finalização da tramitação do projeto de conversão no legislativo e sanção do mesmo pelo executivo, quando então poderemos melhor concluir sobre o assunto.

No entanto, apesar da pendência da aprovação final e sanção presidencial do projeto de conversão em lei da referida Medida Provisória, podemos concluir de todo o exposto acima, que os documentos digitalizados e/ou armazenados em outros meios de conservação de documentos, até o último dia 30 de abril, exceto àqueles especificamente autorizados e nos limites destas autorizações, de carácter geral ou específica, podem ser recusados pelas autoridades competentes, por ausência de suporte legal. Apesar desta possibilidade, não podemos deixar de externar nossa percepção de que salvo raras exceções este não será um problema enfrentado na prática.

Na expectativa de termos contribuído para o esclarecimento do tema, permanecemos à disposição.

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